quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Abaixo, segue alguns poemas do poeta Roberto Piva:

LIBELO

Não mais trarei justificações
Aos olhos do mundo.
Serei incluído
” Pormenor Esboçado ”
Na grande bruma.
Não serei batizado,
Não serei crismado,
Não estarei doutorado,
Não serei domesticado
Pelos rebanhos
Da terra.
Morrerei inocente
Sem nunca ter
Descoberto
O que há de bem e mal
De falso ou certo
No que vi.

(in: Antologia dos Novíssimos, 1961)

Eu vi os anjos de Sodoma escalando
um monte até o céu
E suas asas destruídas pelo fogo
abanavam o ar da tarde
Eu vi os anjos de Sodoma semeando
prodígios para a criação não
perder o ritmo de harpas
Eu vi os anjos de Sodoma lambendo
as feridas dos que morreram sem
alarde, dos suplicantes, dos suicidas
e dos jovens mortos
Eu vi os anjos de Sodoma crescendo
com o fogo e de suas bocas saltavam
medusas cegas
Eu vi os anjos de Sodoma desgrenhados e
violentos aniquilando os mercadores,
roubando o sono das virgens,
criando palavras turbulentas
Eu vi os anjos de Sodoma inventando a
loucura e o arrependimento de Deus

(in: Paranóia, 1963)

XVI

abandonar tudo. conhecer praias. amores novos.
poesia em cascatas floridas com aranhas
azuladas nas samambaias.
todo trabalhador é escravo. toda autoridade
é cômica. fazer da anarquia um
método & modo de visa. estradas.
bocas perfumadas. cervejas tomadas
nos acampamentos. Sonhar Alto.

(in: 20 Poemas com Brócoli, 1981)

ALMA FECAL
Alma fecal contra a ditadura da ciência
Rua dos longos punhais
Garoto fascista belo como a grande noite esquimó
Clube do fogo do inferno: Alquimistas Xamãs
Beatniks
Je vois l’arbre à la langue rouge (Michaux)
Templo
Procissão do falo sagrado
Deuses contemplam nas trevas o sexo
do anjo do Tobogã
Felizes & famélicos garotos seminus dançam
como bibelôs ferozes
Pedras com suas bocas de seda
Partindo para uma existência invisível
Tudo que chamam de história é meu plano
de fuga da civilização de vocês
Represa de Mariporã. 95
(in Ciclines, 1997)

Ritual dos 4 Ventos & dos 4 Gaviões
para Marco Antônio de Ossain

“Eu trago comigo os guardiões
dos Circuitos celestes.”

- Livro dos Mortos do Antigo Egito -

Ali onde o gavião do Norte resplandesce
sua sombra
Ali onde a aventura conserva os cascos
do vudú da aurora
Ali onde o arco-íris da linguagem está
carregado de vinho subterrâneo
Ali onde os orixás dançam na velocidade
dos puros vegetais
Revoada das pedras do rio
Olhos no circuito da Ursa Maior
na investida louca
Olhos de metabolismo floral
Almofadas de floresta
Focinho silencioso da sussuarana com
passos de sabotagem
Carne rica de Exú nas couraças da noite
Gavião-preto do oeste na tempestade sagrada
Incendiando seu crânio no frenesi das açucenas
Bate o tambor
no ritmo dos sonhos espantosos
no ritmo dos naufrágios
no ritmo dos adolescentes
à porta dos hospícios
no ritmo do rebanho de atabaques
Bate o tambor
no ritmo das oferendas sepulcrais
no ritmo da levitação alquímica
no ritmo da paranóia de Júpiter
Caciques orgiásticos do tambor
Com meu Skate-gavião
Tambor na virada do século ganimedes
Iemanjá com seus cabelos de espuma.

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A soma dos olhares levará os galhos a balançarem

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